Revista Encontrar Sonhos IV
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Artigo


 AUTISMO

O autismo é uma perturbação global do desenvolvimento infantil que se prolonga por toda a vida e evolui com a idade.

Características evolutivas

O bebé com autismo apresenta determinadas características diferentes dos outros bebés da sua idade - pode mostrar indiferença pelas pessoas e pelo ambiente. Pode ter problemas ao nível da alimentação e do sono. Pode chorar muito sem razão aparente ou, pode simplesmente nunca chorar.

Quando começa a gatinhar pode fazer movimentos repetitivos (bater palmas, rodar objectos, mover a cabeça de um lado para o outro). Ao brincar, não utiliza o jogo social nem o jogo de faz de conta.

Dos 2 aos 5 anos de idade o comportamento autista tende a tornar-se mais óbvio: a criança não fala ou ao falar, utiliza a ecolália (repetição de sons) ou inverte os pronomes. Há crianças que falam correctamente mas não utilizam a linguagem na sua função comunicativa - demonstrando problemas ao nível da interacção social.

Na adolescência, os autistas podem apresentar uma melhoria ao nível das relações sociais, contudo, podem revelar comportamentos agressivos (com eles ou outros), assim como alguns sinais de imaturidade.

No estado adulto, a estabilidade aumenta de acordo com a competência; isto é, os menos competentes (com baixo QI) continuam a mostrar características de autismo e não conseguem viver com independência e autonomia.

Nas pessoas idosas, os problemas de comportamento podem sofrer um agravamento – resultante dos problemas inerentes à idade, à diminuição da prática de exercício físico, da falta de rotinas, etc... Todavia, existem casos em que o comportamento estabiliza com a idade.

Características do autismo

Sempre existiram pessoas com autismo mas o autismo foi identificado cientificamente em 1943 por Leo Kanner - pedopsiquiatra austríaco radicado nos Estados Unidos da América que publicou um artigo ao qual ele dava o nome de “Autismo” (do grego autos que significa próprio). Nesse artigo, descrevia o estudo de caso de 11 crianças que tinham as seguintes  características:

Um profundo afastamento autista;

Um desejo autista pela conservação da semelhança;

Uma boa capacidade de memorização mecânica;

Expressão inteligente e ausente;

Mutismo ou linguagem sem intenção comunicativa efectiva;

Hipersensibilidade aos estímulos;

Relação estranha e obsessiva com objectos.

Em 1946, a partir de novos estudos, acrescentou a ecolália, linguagem extremamente literal, uso estranho da negativa, inversão pronominal e outras perturbações da linguagem.

Em 1944, um pediatra austríaco Hans Asperger, publicou um artigo, no qual descrevia um grupo de crianças com características muito semelhantes às de Kanner, chamando igualmente "Autismo" à síndrome (curiosamente nenhum deles conhecia a obra do outro). As características das crianças eram semelhantes, porém, havia um grupo com picos de inteligência/linguagem desenvolvidos – por isso, hoje as crianças com essas características são diagnosticadas com síndrome de Asperger.

Lorna Wing (1981) definiu a síndrome de Asperger com 6 critérios de diagnóstico:

Linguagem correcta mas pedante, estereotipada;

Comunicação não verbal - voz monótona, pouca expressão facial, gestos inadequados;

Interacção social não recíproca, com falta de empatia;

Resistência à mudança - Preferência por actividades repetitivas;

Coordenação motora - postura incorrecta, movimentos desastrados, por vezes estereotipias;

Capacidades e interesses - Boa memória mecânica, interesses especiais circunscritos.

A síndrome de Asperger tem uma classificação separada do autismo no DSM IV – TR (Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais). O conceito de espectro de perturbações autísticas baseado na tríade de perturbações é importante para a educação e cuidados das crianças com autismo ou outras perturbações globais do desenvolvimento.

A Tríade de Perturbações no Autismo
As pessoas com autismo têm 3 grandes grupos de perturbações. Segundo Lorna Wing (Wing & Gould,1979), a partir de uma investigação feita em Camberwell, a tríade de perturbações no autismo manifesta-se em 3 domínios: social, linguagem e comunicação, pensamento e comportamento.

Domínio social: o desenvolvimento social é perturbado, diferente dos padrões habituais, especialmente o desenvolvimento interpessoal. A criança com autismo pode isolar-se mas pode também interagir de forma estranha - fora dos padrões habituais.

Domínio da linguagem e comunicação: a comunicação, verbal e não verbal é deficiente e desviada doa padrões habituais. A linguagem pode ter desvios semânticos e pragmáticos. Muitas pessoas com autismo (estima-se que cerca de 50%) não desenvolvem linguagem durante toda a vida.

Domínio do pensamento e do comportamento: rigidez do pensamento e do comportamento, fraca imaginação social. Comportamentos ritualistas e obsessivos, dependência de rotinas, atraso intelectual e ausência de jogo imaginativo.

António Pedro Santos


Sugestão de Visita

FPDA-Federação Portuguesa de Autismo

http://www.fpda.pt/

 

Início

A FPDA-Federação Portuguesa de Autismo é uma pessoa colectiva de direito privado com a natureza de instituição particular de solidariedade social, com sede em Lisboa. Foi fundada em 2003 mas iniciou as suas actividades em Janeiro de 2004.
Tem âmbito nacional e substitui a organização nacional APPDA, Associação Portuguesa para a Protecção aos Deficientes Autistas (anteriormente denominada Associação Portuguesa para a Protecção às Crianças Autistas), fundada em 1971, membro da Associação Internacional Autisme-Europe desde 1988. A Presidente da Federação foi Vice-presidente do Autisme-Europe de 1990 a 2008.
Os membros da Federação são ONGs do desenvolvimento, sem fins lucrativos, Instituições Particulares de Segurança Social, parcialmente financiadas pelo Ministério do Trabalho e da Segurança Social. O restante financiamento é feito através das cotizações dos membros, donativos e patrocínios.
A Federação Portuguesa de Autismo deve promover e apoiar as iniciativas dos seus membros e ajudar a implementar novas organizações. Representa os seus membros junto das organizações públicas e privadas, portuguesas ou estrangeiras que perseguem os mesmos fins.


Vídeo

 

O que são as Perturbações do Espetro do Autismo

Sobre as PEA

O autismo é uma das mais graves perturbações de desenvolvimento da criança, que resulta numa incapacidade que se prolonga durante toda a vida. Manifesta-se através de dificuldades muito específicas ao nível da interacção social, da aquisição e uso convencional da comunicação e da linguagem, pela restrita variedade de interesses e alterações do comportamento.

Estas perturbações, estão geralmente associadas a dificuldades em utilizar a imaginação, em aceitar alterações de rotinas, a um défice de atenção e de concentração, à falta de motivação e à exibição de comportamentos estereotipados, implicam também um défice na flexibilidade de pensamento e um modo de aprender peculiar.

Desta forma, as PEA caracterizam-se por dificuldades em compreender e responder de forma adequada às diferentes situações do meio ambiente, seleccionar e processar informação pertinente, bem como, responder a estímulos sensoriais.

Verifica-se que, embora o autismo resulte de uma disfunção no desenvolvimento do Sistema Nervoso Central e a investigação indique que os factores hereditários e genéticos tenham um peso importante, também, a forma como o meio ambiente aceita e lida com estas crianças e jovens são determinantes no seu desenvolvimento e na sua inclusão social.

Características Específicas

De acordo com a American Psychiatric Association, são apontadas várias características específicas do autismo que originaram os critérios de diagnóstico descritos para as PEA no DSM-IV-TR. No domínio social, os sintomas incluem um défice acentuado no uso da linguagem não verbal (p.e. contacto ocular e expressões faciais), défice nos reguladores de interacção social, incapacidade para resolver conflitos com pares adequados à sua idade, reduzido interesse na partilha com o outro e limitada reciprocidade emocional. Na área da comunicação verifica-se um acentuado défice ou mesmo ausência de linguagem oral, dificuldades em manter uma conversação, linguagem idiossincrática ou repetitiva com ecolália e dificuldades ao nível da pragmática. Quanto aos seus comportamentos e interesses, estes são reduzidos e estereotipados, preocupando-se com partes ou qualidades de objectos (não dando importância à sua funcionalidade). Também é evidente a adesão a rotinas. Paralelamente ao DSM-IV-TR, existe outro manual de diagnóstico, o ICD-10 (International Classification of Disease, 10ª ed.), elaborado pela World Health Organization (WHO), em 1994. Os critérios de diagnóstico são semelhantes. Porém, o especialista que determinar o diagnóstico deve referir qual o manual que está a utilizar.

Áreas de Intervenção

  • Comunicação/Linguagem

Este é o défice mais marcado, ou pelo menos, o que tem maior importância para a maioria dos pais. Muitas das vezes, o facto das crianças não falarem na idade esperada, é o primeiro sinal de alarme para os pais/médicos. Nas crianças com PEA, a fala pode ou não surgir na "idade normal", mas apresenta sempre alterações, desde o tom da voz, à inflexão dada ao discurso até à aplicação rigorosa de determinadas palavras ou expressões (discurso idiossincrático). Por vezes, apresentam também ecolália (repetição de palavras, parte de palavras ou expressões) podendo ser, em certos casos, a forma de comunicar. O processo comunicativo encontra-se sempre alterado quer seja pela recepção da informação, pelo processamento ou pela expressão.

  • Cognição

Tal como na população em geral, também a capacidade cognitiva das crianças com PEA varia de criança para criança. No entanto, dadas as suas características desenvolvimentais, são crianças que compreendem e apreendem o mundo de maneira diferente. Assim, é necessário conhecer a criança e respeitar sempre a sua individualidade, adaptando a forma como se disponibiliza a informação. Só assim se torna possível promover uma estimulação cognitiva. Outro aspecto a ter em consideração é a limitação que apresentam relativamente ao jogo simbólico (semelhante ao "fazer de conta"). Muitas vezes conseguem fazer este jogo não de uma forma espontânea, mas sim aprendida, sendo repetitiva e com pouca margem para mudanças. São crianças com baixo potencial criativo e interesses restritos, que limitam a diversidade de actividades e posteriores aquisições. Desta forma, torna-se importante aumentar o leque de interesses e estimular a imaginação, recorrendo sempre ao "brincar". Se esta á a forma que as crianças têm para aprender não deixa de o ser só porque a criança tem PEA.

  • Socialização

Os indivíduos com PEA revelam muitas lacunas ao nível das competências sociais. Apesar de viverem, aparentemente, num mundo à parte, isso não é de todo verdade. A dificuldade em manter o contacto ocular é evidente. A reciprocidade social é quase inexistente, não se conseguindo colocar no lugar do outro nem prever as consequências e o impacto que as suas atitudes têm. O défice ao nível da comunicação não verbal também interfere no desenvolvimento das relações interpessoais. Por exemplo, os indivíduos com PEA têm dificuldade em compreender a necessidade de responder a um "olá" ou a um "adeus". Podemos observar, ainda, vários tipos de comportamentos sociais (auto e hetero-agressividade, passividade, indiferença, assertividade), que se manifestam de acordo com as características dos contextos nos quais estão inseridos.

  • Autonomia

Esta é uma das áreas na qual estas crianças são capazes de melhorar a performance aquando de estimulação. As rotinas do dia-a -dia devem estar bem estruturadas de modo a conseguirem antecipar as diferentes actividades da vida diária (AVD'S). Esta estruturação pode ser reforçada através de um quadro de tarefas com pistas visuais, ou simplesmente pelas pistas verbais dos pais. Uma vez que nas AVD's se repetem os mesmos gestos diariamente, são mais fáceis serem incutidos. Os pais, cuidadores e educadores deverão exigir sempre a execução das tarefas dando apenas ajuda mínima para se obter sucesso na concretização destas.

  • Área sensorio-motora

Nas crianças com PEA é possível observarmos algumas alterações motoras, nomeadamente na sequência do desenvolvimento motor. Esta sequência de aquisições não é tão linear como nas crianças ditas normais. Frequentemente, ultrapassam etapas de desenvolvimento. Por outro lado, a sua motricidade global e fina apresentam níveis mais baixos quando comparados com a população normal da mesma idade. Este facto interfere directamente no seu nível de autonomia e independência. Por fim, é importante salientar as estereotipias (movimentos repetitivos sem significado) presentes na maioria dos indivíduos com PEA. As estereotipias podem manifestar-se quer por movimentos quer por comportamentos/rotinas estereotipadas, podendo modificar-se ao longo da vida. Também são visíveis flutuações da sensibilidade podendo a mesma criança revelar hipo ou hiper-reactividade a diferentes estímulos sejam eles sonoros, visuais, tácteis ou cinestésicos.

  • Dinâmica Escolar

Como qualquer criança, também as crianças com PEA devem ir à escola, sendo este um óptimo local para o contacto/relação com outras crianças, vivenciar novas experiências e fomentar o processo ensino-aprendizagem. Torna-se, no entanto, primordial que este seja um local aprazível e que respeite as características destas crianças, promovendo a inclusão. Desta forma evitam-se atitudes desajustadas por parte da criança, que são, frequentemente, mal interpretadas pelos pares e professores. Deve ter-se em consideração que se a criança souber o que esperam dela e quais as suas tarefas, melhor será o seu desempenho e melhor será a sua adaptação ao meio.

  • Dinâmica Familiar

Quando nasce uma criança há sempre alterações e reestruturações no meio familiar. Quando a criança tem uma PEA todas estas mudanças apresentam muito maior impacto na dinâmica familiar e regem-se por uma grande importância no dia-a-dia. As mudanças que ocorrem verificam-se tanto a nível físico (por vezes é necessário reestruturar a casa com o intuito de diminuir os locais de perigo) como emocional e comportamental, visto à família ser exigida uma adaptação ao funcionamento da criança e não o contrário (como é habitual).

 In http://www.fundacaoamaautismo.pt/


Coordenação: António Pedro Santos

Maio de 2014, Revista Encontrar Sonhos IV